Por Linei Matz
A história começa com uma citação de Marion Zimmer Bradley, retirada da quadrilogia As Brumas de Avalon: “[…] é aquilo em que a humanidade acredita que modela o mundo e toda a realidade”. E assim introduz a protagonista Bárbara Falcão, que nos acompanhará do início ao fim dessa aventura cheia de movimentos e simbologias, na qual Bárbara terá de fazer a grande Travessia por aquele mundo fantástico, à moda das grandes Epopeias clássicas, para encontrar-se e provar seu valor.
“Bárbara”, na verdade, não é seu nome original: ela foi salva por uma guerreira da Água, Svétcha, que se torna sua guardiã e alma gêmea e lhe sugere essa alcunha já nos primeiros capítulos. A situação traumática da qual foi salva nega à protagonista a memória de quem é ou de onde vem. Por isso, aceita a sugestão de sua nova amiga.
A origem de Bárbara, porém, fica clara no decorrer da narrativa: ela viera do Castelo de Ar, um lugar considerado o centro do Mundo Fora das Margens, e onde se acredita que um deus único comanda todas as coisas.
Já “Falcão” vem do fato de o animal da protagonista — cada guerreira tinha o seu próprio animal, símbolo de sua força — ficar visível em sua cabeça assim que raspam os cabelos quando debuta no mundo das Guerreiras da Água. O resgate da protagonista, na verdade, a traz de volta ao Quadrante I, origem de sua mãe Káris e de sua avó Arga (a senhora de prata), no qual somente mulheres guerreiras habitam. Bárbara se torna uma delas.
Ao contrário do povo do Castelo, essas grandes mulheres só acreditam em sua própria força, não admitem nenhuma deusa ou deus em seu imaginário.
A travessia de Bárbara segue seu curso, facilitada justamente por essa crença — às vezes nem tão forte assim — em si mesma e em sua capacidade de vencer obstáculos e inimigos. Ela tem a chance de conhecer o restante do mundo fantástico onde vive, dividido em quatro quadrantes: o II é composto somente por homens caçadores, que acreditam na Grande Mãe, protetora de suas caças; o III tem um povo bastante peculiar: os Mentes Luminosas, que creem na deusa Noite. Muitos deles desenvolvem a capacidade de mudar tanto a própria aparência quanto a realidade; o IV é povoado pelas guerreiras do fogo, o povo que luta pelas causas erradas.
Em sua travessia, Bárbara passará por essas terras e outras mais. Como esperado, não sairá delas ilesa: ela terá a oportunidade de rever seu irmão gêmeo Alix e se envolverá com o irmão gêmeo de Svétcha: o caçador do Quadrante II, Zaar. Além de conhecer os Subvérsis, povo do qual veio o seu pai.
Ela sofrerá além de seus limites, lutará contra os revolucionários, mas fará o seu arco e reemergirá outra mulher, muito melhor do que a do início de sua vida como Guerreira da Água.
Em uma aventura final, conhecerá o Povo da Areia e o Povo Salgado. Chegará com eles ao topo do mundo, onde habitam as criaturas perfeitas.
É muito fácil pensar que Bárbara é uma guerreira livre, dona de seu destino. Na verdade, porém, essa liberdade encontra limites em suas ancestrais e em toda a carga hereditária que elas lhe impõem. Encontra limites também em seu próprio imaginário, com o qual interpreta o que vive de acordo com suas crenças e suas expectativas.
Bárbara vai modelando o mundo e a realidade em uma espiral que nos traz de volta à citação de Bradley no início do romance.
Vale a pena conferir.
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Linei Matz é escritora, professora de línguas, feminista e mãe. Formada em Letras e Mestra em Português e Filologia pela Universidade de São Paulo, tem publicada uma gramática de português para estrangeiros e contos e poemas nas coleções “Um Teto Todo Nosso” da Editora Polifonia. No momento, se dedica ao romance GAIA SOB O MAR, continuação de FILHAS DE GAIA.