Água Fresca para as Flores de Valérie Perrin é um romance de formação
Por Linei Matz
É a história de Violette, uma moça órfã que, apesar de não ter conhecido sua família biológica, encontra seu lugar no mundo por meio do trabalho e do amor pelos amigos. Ela aprende a ler sozinha, cria sua família, vive com o homem que escolhera para seu marido.
A vida, porém, não se cansa de lhe dar rasteiras, de provocar traumas em alguém que não teve um bom começo, mas segue firme, apoiada por uma rede de pessoas que a amam, cada uma do seu jeito.
“Tudo é efêmero, Violette. Nós somos passageiros” — Afirma um de seus amigos, o padre Cédric. E pode-se dizer que é exatamente assim a passagem das mais diversas personagens pela vida da protagonista, algumas das quais ela revê com o passar do tempo e pode observar o seu arco, o que nelas mudou ou deixou de mudar.
A própria Violette tem seu arco na história: aprende a encarar seus dramas e tragédias pessoais como algo passageiro também. Até o momento em que é agredida pelo próprio marido, Philippe, e ele acaba sendo incluído em suas recordações, como uma mera lembrança:
“(ele) pegara Violette com brutalidade, apertara seus braços com força, como se quisesse esmagá-la. Como quando o homem se torna um carrasco para não sentir nada. Precisava evocar o ódio.”
Philippe amava a esposa, apesar da personalidade narcisista e de suas constantes traições: feito o menino mimado que era, não poderia se comportar de outra forma. Ele era o taker, o que toma para si tudo o que pode, porque acha que tem direito a qualquer coisa que queira.
Violette era a giver, a que veste e alimenta esse mesmo marido mimado, sem nunca receber dele um tostão para pagar as contas da casa. Ele vai tomando a juventude da esposa, o amor que ela lhe tinha no começo, a filha que os dois tiveram juntos.
Porque ele não foi um bom pai, não soube defender a filha, e ele reconhece isso. E deixou a esposa/mãe sozinha para conviver com suas mágoas.
Água Fresca para as Flores é uma leitura bastante contemporânea, densa ao mesmo tempo que leve, difícil de largar do início ao fim. E recheada de poesia, de cartas, de lembranças. Recheada de vida.
Linei Matz é professora de línguas, escritora, feminista e mãe, não necessariamente nessa ordem. Publicou uma gramática de Português para Estrangeiros; contos e poesias nas coletâneas Um teto todo nosso, Narrativas Curtas e Poesias, volumes 2 e 3, pela Editora Polifonia; conto na Revista Contos de Samsara. Autopublica no Kindle Amazon e hoje trabalha em seu quarto romance, sequência de Filhas de Gaia.